"A epidural cria uma separação entre a mulher e o seu corpo no momento em que ela mais tem necessidade de saber, e sobretudo sentir, o que está acontecendo. A mãe fica imobilizada, pregada numa cama durante todo o trabalho, sem a possibilidade de fiar-se em suas sensações - que praticamente deixam de existir. Ela só obedece às ordens do médico e sujeita-se às suas intervenções. A parte superior do corpo assiste, impotente e submissa, à intervenção médica efectuada na parte inferior. Incapaz de participar, a mulher fica condenada a suportar; quanto ao bebé, tem de enfrentar sozinho as contracções. A mãe é forçada a abandoná-lo em plena tormenta, não
seguem juntos o mesmo percurso."
Quando o corpo consente, Marie Bertherat
"Seja qual for a forma, por enquanto misteriosa, da minha dor, ela será minha e já é minha. A dor do parto não será uma dor imposta. Não tem nada a ver com a dor do corpo machucado ou ferido. Esta sim, enfraquece, avilta,destrói. Esta merece ser anestesiada. Não a dor do nascimento. Não quero. Ouvi muitas mulheres falarem das dores do parto como um sofrimento imposto. Para elas, a sensação dolorosa das contracções é intolerável, é uma maldição herdada de mãe para filha, uma passagem compulsória e inaceitável na era em que a farmacopéia permite sua isenção. Calar essa dor parece-lhes vital. Eu as entendo. Entendo sobretudo porque elas estão se preparando para dar à luz em lugares frios e impessoais, nos quais todo o mundo só fala de dor a suportar ou de anestésicos milagrosos que podem dar alívio.
Mas não será um engodo? Por trás do discurso anti-dor das mulheres não haverá outra coisa? O medo do desconhecido, o medo da emoção, o medo de ser mãe, o medo de ser responsável por um outro ser. Será que a anestesia consegue aliviar esses medos?(...)
Deixar a própria dor manifestar-se pode ser indispensável, porque isso ajuda a mãe a conhecer-se melhor, inclusivé a conhecer seu próprio nascimento. Nascer outra vez ao dar a vida."
Quando o corpo consente, Marie Bertherat
"O importante é sentir tudo. Se se aprender a fazer isso, através da respiração e relaxamento, é como uma contemplação com o nosso corpo. É como se o útero fosse o condutor e a mulher o maestro da orquestra."
Entrevista a Sheila Kitzinger
"Com o uso da analgesia peridural, há uma tendência para que o primeiro estágio do trabalho de parto seja um pouco mais longo, e com o uso mais frequente de ocitocina. Em vários relatos e estudos, constatou-se um aumento do número de partos vaginais operatórios, especialmente se o efeito analgésico foi mantido durante o segundo estágio do trabalho de parto, suprimindo assim o reflexo do puxo. Num estudo americano recente, o número de cesarianas aumentou quando se utilizou analgesia peridural, especialmente quando iniciada antes de 5cm de dilatação (Thorp et al 1993)."
in Guia Prático para a Assistência ao Parto Normal, OMS, 2000
"Uma tarefa importante do parteiro é ajudar as mulheres a suportar a dor durante o trabalho de parto. Isto pode ser obtido com o alívio farmacológico; porém mais fundamental e mais importante é a abordagem não farmacológica, iniciado durante o pré-natal com o fornecimento de informações tranquilizadoras à gestante e ao seu companheiro, e também à sua família, se necessário. O apoio empático de prestadores de serviço e acompanhantes, antes e durante o trabalho de parto, pode diminuir a necessidade de analgesia farmacológica e assim melhorar a experiência de dar à luz."
in Guia Prático para a Assistência ao Parto Normal, OMS, 2000